quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

SANTO DO DIA - 28 DE JANEIRO

Tomás de Aquino

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
São Tomás de Aquino, O.P.
Triunfo de São Tomás de Aquino sobre os heréticos.
Entre 1489 e 1491. Por Filippino Lippi, na Igreja de Santa Maria sopra Minerva, em Roma.
Nascimento25 de janeiro de 12251  emRoccaseccaLácioReino da Sicília
Morte7 de março de 1274 (49 anos)1  emAbadia de FossanovaLácioReino da Sicília
Veneração porIgreja Católica
Comunhão Anglicana
Igreja Luterana
Canonização18 de julho de 1323AvinhãoEstados Papais por Papa João XXII
PrincipaltemploIgreja dos JacobinosToulouse,França
Festa litúrgica28 de janeiro
AtribuiçõesSuma Teológica; modelo de uma igreja; sol no peito de um fradedominicano
PadroeiroAcadêmicos; contra tempestades; contra raios; apologistas; livreiros; academias, escolas e universidades católicas; castidade; ensino; filósofos; editores; acadêmicos; estudantes; teológos; diversas cidades2
Gloriole.svg Portal dos Santos
Tomás de Aquino, em italiano Tommaso d'Aquino (Roccasecca1225  — Fossanova7 de março de 1274), foi um frade daOrdem dos Pregadores (dominicano) italiano3 4 cujas obras tiveram enorme influência na teologia e na filosofia, principalmente na tradição conhecida como Escolástica, e que, por isso, é conhecido como "Doctor Angelicus", "Doctor Communis" e "Doctor Universalis"5 [a]. "Aquino" é uma referência ao condado de Aquino, uma região que foi propriedade de sua família até 1137.
Ele foi o mais importante proponente clássico da teologia natural e o pai do tomismo. Sua influência no pensamento ocidental é considerável e muito da filosofia moderna foi concebida como desenvolvimento ou oposição de suas ideias, particularmente na éticalei naturalmetafísica e teoria política. Ao contrário de muitas correntes da Igreja na época6 , Tomás abraçou diversas ideias de Aristóteles - a quem ele se referia como "o Filósofo" - e tentou sintetizar a filosofia aristotélica com os princípios do cristianismo. As obras mais conhecidas de Tomás são a "Suma Teológica" (em latim:Summa Theologiae) e a "Suma contra os Gentios" (Summa contra Gentiles). Seus comentários sobre as Escrituras e sobre Aristóteles também são parte importante de seu corpus literário. Além disso, Tomás se distingue por seus hinos eucarísticos, que ainda hoje fazem parte da liturgia da Igreja7 .
Tomás é venerado como santo pela Igreja Católica e é tido como o professor modelo para os que estudam para osacerdócio por ter atingido a expressão máxima tanto da razão natural quanto da teologia especulativa. O estudo de suas obras há muito tempo tem sido o cerne do programa de estudos obrigatórios para os que buscam as ordens sagradas(como padres e diáconos) e também para os que se dedicam à formação religiosa em disciplinas como filosofia católica, teologia, história, liturgia e direito canônico8 . Tomás foi também proclamado Doutor da Igreja por Pio V em 1568. Sobre ele, declarou Bento XV:
Esta ordem [dominicana]... ganhou novo lustre quando a Igreja declarou os ensinamentos de Tomás como seus próprios e este Doutor, honrado por elogios especiais dos pontífices, o mestre e patrono das escolas católicas.
 
— Fausto appetente diePapa Bento XV9 .

Biografia[editar | editar código-fonte]

Primeiros anos (1225-1244)[editar | editar código-fonte]

Aquino, no Lácio, a cidade-natal de Tomás de Aquino.
Tomás nasceu em Roccasecca, no condado de Aquino do Reino da Sicília (atualmente na região do Lácio, na Itália) por volta de 1225. De acordo com alguns autores, nasceu no castelo de seu pai, Landulfo de Aquino, que não pertencia ao ramo mais poderoso de sua família e era apenas um miles ("cavaleiro"). Já a mãe de Tomás, Teodora, era do ramo dos Rossi da família napolitana dos Caracciolo10 . Enquanto o resto da família se dedicou à carreira militar11 , seus pais pretendiam que Tomás seguisse o exemplo do irmão de Landulfo, Sinibaldo, que era abade do mosteiro beneditino de Monte Cassino12 , uma carreira perfeitamente normal para o filho mais jovem de uma família nobre do sul da Itália da época13 .
Aos cinco anos de idade, Tomás começou a estudar em Monte Cassino, mas, depois que o conflito militar entre o imperadorFrederico II e o papa Gregório IX chegou à abadia no início de 1239, Landulfo e Teodora matricularam o pequeno Tomás nostudium generale (a universidade em Nápoles), recém-criada por Frederico em Nápoles14 . Foi provavelmente lá que Tomás conheceu Aristóteles, Averróis e Maimônides, importantes influências para sua filosofia teológica15 . Seu professor dearitméticageometriaastronomia e música era Pedro da Ibérnia16 .
Foi também durante seus estudos em Nápoles que ele acabou sob a influência de João de São Juliano, um pregador dominicano que era parte do grande esforço empreendido pela Ordem dos Pregadores para recrutar seguidores17 . Finalmente, aos dezenove, Tomás resolveu se juntar à ordem, o que não agradou sua família18 . Numa tentativa de impedir que Teodora influenciasse a escolha de Tomás, os dominicanos arranjaram para que ele se mudasse paraRoma e, de lá, para Paris19 . Porém, durante a viagem para Roma, seguindo as instruções de Teodora, seus irmãos o capturaram quando ele bebia num riacho e o levaram de volta para seus pais no castelo de Monte San Giovanni Campano19 .
Tomás ficou preso por cerca de um ano nos castelos da família em Monte San Giovanni e Roccasecca numa tentativa de fazê-lo mudar de ideia15 . Preocupações políticas impediram que o papa interviesse em defesa de Tomás, aumentando significativamente o tempo que ficou preso20 . Durante este período de provações, Tomás ensinou suas irmãs e escreveu para seus irmãos dominicanos15 . Desesperados com a teimosia de Tomás, dois de seus irmãos chegaram a ponto de contratarem uma prostituta para seduzi-lo. De acordo com a lenda, Tomás a expulsou com um ferro em brasa e, durante a noite, dois anjos apareceram para ele enquanto ele dormia para fortalecer sua determinação de permanecer celibatário21 .
Em 1244, percebendo que todas as suas tentativas de dissuadir Tomás fracassaram, Teodora tentou salvar a dignidade da família e arranjou para ele escapasse durante uma noite pela janela. Ela acreditava que uma fuga secreta da prisão era menos prejudicial que uma rendição aberta aos dominicanos. Tomás seguiu primeiro para Nápoles e, depois, para Roma, onde se encontrou com João de Wildeshausen, o mestre-geral da Ordem dos Pregadores22 .

Paris, Colônia, Alberto Magno e a primeira regência em Paris (1245-1259)[editar | editar código-fonte]

Abadia de Monte Cassino. Tomás estudou ali até ser obrigado a se mudar por causa de guerras políticas. Depois de recusar o convite para ser abade do mosteiro anos depois, Tomás se viu ali novamente pouco antes de morrer quando se hospedou no mosteiro para se recuperar de uma doença.
Em 1245, Tomás foi enviado para estudar na faculdade das artes da Universidade de Paris, onde é muito provável que ele tenha encontrado o estudioso dominicano Alberto Magno (que seria depois proclamado Doutor da Igreja como Aquino), que era na época o catedrático da cadeira de Teologia do Colégio de São Tiago em Paris23 . Quando Alberto foi enviado por seus superiores para ensinar no novo studium general em Colônia, em 1248, Tomás foi junto24 depois de recusar uma oferta do papa Inocêncio IV de nomeá-lo abade de Monte Cassino mesmo sendo dominicano12 . Em seguida, Alberto nomeou o relutante Tomás magister studentium13 . Por ser calado e não falar muito, alguns dos companheiros de Tomás acreditavam que ele era "devagar", ao que Alberto rebateu, profeticamente, "Vocês o chamam de boi burro, mas em sua doutrina ele produzirá um dia um mugido tal que será ouvido pelo mundo afora"12 .
Tomás lecionou em Colônia como professor aprendiz (baccalaureus biblicus), instruindo seus alunos nos livros do Antigo Testamento e escrevendo "Comentário Literal sobre Isaías" ("Expositio super Isaiam ad litteram"), "Comentário sobreJeremias" ("Postilla super Ieremiam") e "Comentário sobre as Lamentações" ("Postilla super Threnos")25 . Então, em 1252, Tomás retornou para Paris para tentar obter o mestrado em teologia e passou a ensinar estudos bíblicos como professor aprendiz. Quando tornou-se "baccalaureus Sententiarum" ("bacharel das Sentenças")26 , dedicou seus três anos finais de estudo a comentar sobre as "Sentenças" de Pedro Lombardo. Na primeira de suas quatro sínteses teológicas, Tomás compôs um enorme comentário sobre elas chamado "Comentário sobre as Sentenças" ("Scriptum super libros Sententiarium"). Além destas obras de seu mestrado, Tomás escreveu ainda "Sobre o Ser e a Essência" ("De ente et essentia") para seus companheiros dominicanos de Paris12.
Na primavera de 1256, Tomás foi nomeado regente principal em teologia em Paris e uma de suas primeiras obras depois de assumir o cargo foi "Contra Aqueles que Ameaçam a Devoção a Deus e a Religião" ("Contra impugnantes Dei cultum et religionem") defendendo as ordens mendicantes que estavam na época sob ataque por Guilherme de Saint-Amour27 . Durante seu mandato, que foi de 1256 até 1259, Tomás escreveu diversas obras, incluindo: "Questões em Disputa sobre a Verdade" ("Questiones disputatae de veritate"), uma coleção de vinte e nove questões controversas sobre aspectos da fé e da condição humana28 preparada para os debates universitários públicos que ele presidia na Quaresma e no Advento29 ; "Quaestiones quodlibetales", uma coleção de suas respostas às questões propostas pela audiência acadêmica nos debates28 e o par "Comentários sobre 'De trinitate' de Boécio" ("Expositio super librum Boethii De trinitate") e "Comentário sobre 'De hebdomdibus' de Boécio" ("Expositio super librum Boethii De hebdomadibus"), comentários sobre as obras do filósofo romano do século VI Boécio30 . Quando terminou sua regência, Tomás estava trabalhando numa de suas obras-primas, a "Suma contra os Gentios"31 .

Nápoles, Orvietto e Roma (1259-1268)[editar | editar código-fonte]

Basílica de Santa Sabina, em Roma, onde Aquino ensinou por muitos anos antes de voltar a Paris.
Em 1259, Tomás completou sua primeira regência no studium generale e deixou Paris para que outros pudessem obter a mesma experiência. Retornando para Nápoles, foi nomeado pregador geral pelo capítulo provincial da ordem em 29 de setembro de 1260. Em setembro do ano seguinte, foi enviado a Orvietto como leitor conventual responsável pela formação dos frades que não podiam frequentar um studium generale. Lá, completou a "Suma contra os Gentios", escreveu "A Corrente de Ouro" (Catena aurea)32 e escreveu obras para o papa Urbano IV, como a liturgia para a recém-criada festa de Corpus Christi e "Contra os Erros dos Gregos" ("Contra errores graecorum")31 .
Em fevereiro de 1265, o recém-eleito papa Clemente IV convocou Aquino a Roma para servir como teólogo papal. No mesmo ano, foi ordenado pelo capítulo dominicano de Agnani33 para ensinar no studium conventuale do Convento de Santa Sabina, fundado alguns anos antes, em 122234 . O studium em Santa Sabina rapidamente tornou-se um experimento para os dominicanos, o primeiro studium provinciale, uma escola intermediária entre o studium conventiale (restrito aos residentes das casas monásticas - mosteiros e conventos) e o studium generale (as universidades nas grandes cidades). Antes disso, não havia na província de Roma nenhuma forma de educação especializada, apenas as escolas conventuais, com cursos básicos de teologia para os frades residentes, e ainda assim apenas na Toscana35 . Tolomeo da Lucca, um parceiro e um dos primeiros biógrafos de Aquino, conta que, nostudium de Santa Sabina, Aquino ensinou uma ampla de temas filosóficos, morais e naturais36 .
Foi em Santa Sabina que Tomás começou a escrever sua obra mais famosa, a "Suma Teológica"32 , que ele concebeu como sendo mais adequada especificamente aos estudantes em seus primeiros anos: "Pois um doutor da verdade católica deveria ensinar não apenas os proficientes, mas a ele cabe também instruir os iniciantes. Como diz oapóstolo em I Coríntios 3:2 'Leite vos dei a beber, não vos dei comida; porque ainda não podíeis', nossa intenção com esta obra é apresentar tudo sobre a religião cristã de uma forma pertinente à instrução de iniciantes"37 . Ele escreve em Orvietto também uma variedade de outras obras, como o incompleto "Compêndio Teológico" ("Compendium Theologiae") e "Resposta ao Irmão João de Vercelli sobre os 108 Artigos Retirados da Obra de Pedro de Tarentaise" ("Responsio ad fr. Ioannem Vercellensem de articulis 108 sumptis ex opere Petri de Tarentasia")30 . Em sua posição de superior do studium, Aquino conduziu uma série de importantes debates sobre o poder de Deus que compilou depois em sua "Do Poder" ("De potentia")38 . Nicholas Brunacci (1240-1322) estava entre os alunos de Aquino em Santa Sabina e, depois, em Paris. Em novembro de 1268, ele estava com Aquino e seu parceiro e secretário, Reginaldo de Piperno, quando deixaram Viterbo à caminho de Paris para o início do ano acadêmico39 . Outro aluno em Santa Sabina foi o beato Tommasello de Perúgia40 .
Aquino permaneceu no studium de Santa Sabina de 1265 até ser chamado de volta a Paris em 1268 para uma segunda regência38 . Com o tempo, principalmente depois de sua partida, as atividades pedagógicas no studium provinciale de Santa Sabina foram divididos em dois campi. Um novo convento da ordem na Igreja de Santa Maria sopra Minerva começou de forma modesta em 1255 como uma comunidade de mulheres recém-convertidas, mas cresceu rapidamente em tamanho e em importância de ser entregue aos cuidados dos frades dominicanos em 127541 . Em 1288, o componente teológico do currículo provincial para a educação dos frades foi realocado do studium provinciale de Santa Sabina para o studium conventuale de Santa Maria sopra Minerva, que foi então rebatizado como um studium particularis theologiae42 . No século XVI, estestudium foi transformado no Colégio de São Tomé (em latimCollegium Divi Thomæ) e, no século XX, o colégio foi transferido para o Convento de Santi Domenico e Sisto e transformado na Pontifícia Universidade de São Tomás de Aquino (o famoso "Angelicum").

A difícil segunda regência em Paris (1269-1272)[editar | editar código-fonte]

Influências
Duas das maiores influências sobre o pensamento de Tomás de Aquino representadas na "Escola de Atenas", de Rafael.
Em 1268, a Ordem dos Pregadores nomeou Tomás para ser o regente mestre da Universidade de Paris pela segunda vez, uma posição que ele manteve até a primavera de 1272. Parte da razão para esta súbita transferência parece ter sido a ascensão do "averroísmo", conhecido também como "aristotelismo radical", nas universidades. Como resposta a estes aparentes malefícios, Tomás escreveu duas obras. Na primeira, "Sobre a Unidade do Intelecto, Contra os Averroístas" ("De unitate intellectus, contra Averroistas"), ele ataca o averroísmo como sendo incompatível com a doutrina cristã43 . Foi durante a segunda regência que Aquino terminou a segunda parte da "Suma" e escreveu "Dos Virtuosos" ("De virtutibus") e "Da Eternidade do Mundo" ("De aeternitate mundi")38 , esta tratando do controverso conceito aristotélico e averroísta sobre a "falta de começo" do mundo44 .
Controvérsias com alguns importantes franciscanos como Boaventura e João Peckham ajudaram a tornar a segunda regência muito mais difícil e conturbada que a primeira. Um ano antes de tomar posse novamente, nos debates de 1266-67 em Paris, o mestre franciscano Guilherme de Baglione acusou Tomás de encorajar os averroístas, chamando-o de "líder cego dos cegos". Tomás chamou-os de "murmurantes" ("resmungões")44 . Na realidade, ele ficou profundamente perturbado pela disseminação do averroísmo e se enfureceu quando soube que Siger de Brabante estava ensinando interpretações averroístas de Aristóteles aos seus alunos em Paris45 .
Em 10 de dezembro de 1270, o bispo de ParisEtienne Tempier, publicou um édito condenando treze proposições aristotélicas e averroístas como sendo heréticas e excomungou os que continuavam a defendê-las46 . Muitos na comunidade eclesiástica, os chamados "agostinianos", temiam que a introdução do aristotelismo e sua versão mais extrema, o averroísmo, pudesse de alguma forma contaminar o purismo da fé cristã. No que parece ter sido uma tentativa de conter o temor contra o pensamento aristotélico, Tomás conduziu uma série de debates entre 1270 e 1272, reunidos em "Sobre as Virtudes em Geral" ("De virtutibus in communi", "Sobre as Virtudes Cardinais" ("De virtutibus cardinalibus") e "Sobre a Esperança" ("De spe").

Últimos anos (1272-1274)[editar | editar código-fonte]

Em 1272, Tomás pediu licença da Universidade de Paris quando os dominicanos de sua província natal o convocaram para fundar um studium general onde quisesse, com liberdade para empregar nele quem desejasse. Aquino escolheu Nápoles e se mudou para lá para assumir o posto de regente mestre38 . Ele aproveitou esta temporada ali para trabalhar na terceira parte da "Suma" enquanto dava aulas sobre vários tópicos religiosos. Em 6 de dezembro de 1273, Tomás se demorou um pouco mais na Capela de São Nicolau do convento dominicano de Nápoles e foi visto pelo sacristão Domenic de Casertalevitando aos prantos em oração diante de um ícone de Cristo crucificado. Segundo o relato, Cristo perguntou: "Escrevestes bem sobre mim, Tomás. Que recompensa esperas pelo teu trabalho?" A resposta foi: "Nada além de ti, Senhor" 47 48 . Depois desta conversa, algo mudou, mas Aquino jamais falou ou escreveu sobre o tema. Depois de ver o que viu, ele abandonou sua rotina e parou de ditar para seu secretário, Reginaldo de Piperno. Quando este implorou-lhe que voltasse ao trabalho, Tomás lhe disse: "Reginaldo, não posso, pois tudo o que escrevi não passa de uma palha para mim"49 ("mihi videtur ut palea")50 . Seja o que for que tenha despertado a mudança no comportamento de Tomás de Aquino, os católicos acreditam que foi alguma espécie de experiência sobrenatural de Deus51 .
Anos antes, em 1054, o Grande Cisma dividiu a Igreja entre a Igreja Latina, sob a liderança do papa (posteriormente conhecida como Igreja Católica Romana), no ocidente e os quatro patriarcados do oriente (conhecidos coletivamente comoIgreja Ortodoxa). Numa tentativa de reunir as duas partes, o papa Gregório X convocou o Segundo Concílio de Lyon em 1 de maio de 1274 e ordenou que Tomás comparecesse52 para apresentar sua obra "Contra os Erros dos Gregos" ("Contra errores graecorum")53 . À caminho do concílio, montado num jumento enquanto viajava pela Via Ápia52 , bateu a cabeça num galho de uma árvore tombada, ficou seriamente ferido e foi levado às pressas para Monte Cassino para se recuperar54. Depois de descansar por um tempo, tentou novamente seguir viagem, mas teve que parar, doente novamente, na abadiacisterciense de Fossanova55 . Os monges tentaram ajudá-lo por diversos dias, mas ele não resistiu. Quando recebeu suaextrema unção, as últimas palavras de Aquino foram:
Eu te recebo, Resgate pela minha alma. Pelo teu amor estudei e me mantive vigilante, trabalhei, preguei e ensinei..."
 
— Tomás de Aquino56 .
São Tomás de Aquino finalmente morreu em 7 de março de 127455 enquanto ditava seus comentários sobre o Cântico dos Cânticos57 .

Filosofia[editar | editar código-fonte]

Tomás era um teólogo e filósofo escolástico58 . Porém, ele jamais se considerou filósofo e os criticava por acreditar que eram pagãos que estavam sempre "aquém da verdadeira e correta sabedoria encontrada na revelação cristã"59 .
Mesmo assim, ele tinha muito respeito por Aristóteles, tanto que, na "Suma", geralmente cita-o simplesmente como "o Filósofo". Boa parte desta obra trata de tópicos filosóficos e, neste sentido, pode ser considerada filosófica. O fato é que o pensamento de Tomás exerceu uma enorme influência sobre a teologia cristã subsequente, especialmente a daIgreja Católica, mas também para toda a filosofia ocidental em geral.

Comentários sobre Aristóteles[editar | editar código-fonte]

Aquino escreveu diversos comentários importantes sobre as obras de Aristóteles, incluindo "Da Alma", "Ética a Nicômaco" e "Metafísica". Estes trabalhos estão associados com as traduções para o latim feitas por William de Moerbeke.

Epistemologia[editar | editar código-fonte]

Aquino acreditava "que para o conhecimento de qualquer verdade, o homem precisa da ajuda divina; que o intelecto pode ser movido por Deus a agir"60 . Porém, ele acreditava também que os seres humanos tinham a capacidade natural de conhecer muitas coisas sem nenhuma revelação divina especial, apesar de revelacões ocorrerem de quando em quando "especialmente em relação àquelas [verdades] pertinentes à fé"61 . Mas esta é a luz dada ao homem por Deus na proporção da natureza humana: "Agora todas as formas concedidas às coisas criadas por Deus tem poder para determinadas ações, que podem realizar na medida de sua própria dotação; e além disto, sâo impotentes, exceto por meio de uma forma adicionada, como água que só esquenta quando aquecida pelo fogo. E assim a compreensão humana tem uma forma, viz. luz inteligível, que, por si só, é suficiente para conhecer certas coisas inteligíveis, viz. as que se pode aprender através dos sentidos"61 .

Ética[editar | editar código-fonte]

A ética de Tomás de Aquino se baseia no conceito dos "princípios primeiros da ação"62 . Na "Suma", ele escreveu:
Virtude denota uma certa perfeição de um poder. Agora a perfeição de algo é considerada principalmente em relação à sua finalidade. Mas a finalidade do poder é ato. Por isso diz-se que um poder é perfeito na medida que é determinante para seu ato
 
— Suma Teológica, Tomás de Aquino63 .
Mais adiante, ele completa:
Diz-se que a sinderese é a lei de nossa mente, pois trata-se do hábito que contém os preceitos da lei natural, que são os princípios primeiros das ações humanas"
 
— Suma Teológica, Tomás de Aquino64 65 .
São Tomás de Aquino.
ca. 1395. Por Fra Angelico, atualmente na Collezione Vittorio Cini, em Veneza.
De acordo com ele, "...todos os atos da virtude são prescritos pela lei natural: como a razão de cada um naturalmente dita que ele aja virtuosamente. Mas se falarmos de atos virtuosos considerados em si mesmos, ou seja, em suas próprias espécies, segue que nem todos os atos virtuosos são prescritos pela lei natural: pois muitas coisas são realizadas virtuosamente, mas cuja natureza não se inclinava para inicialmente; mas que, pelo inquérito da razão, foram percebidas pelos homens como condutivas ao bem estar". A conclusão é que é necessário determinar se estamos falando de atos virtuosos sob o aspecto das virtudes ou como um ato per se, em sua própria espécie66 .
Tomás definiu as quatro virtudes cardinais como sendo prudênciatemperançajustiça e coragem (ou "fortaleza"). Segundo ele, elas não naturais, reveladas na natureza e inerentes a todos. Há, porém, três virtudes teológicasesperança ecaridade. Estas, por outro lado, são algo sobrenaturais e distintas das demais em seu objeto: Deus. Segundo o próprio Aquino:
Agora o objeto das virtudes teológicas é o próprio Deus, que é a última finalidade de tudo e acima do conhecimento da nossa razão. Por outro lado, o objeto das virtudes morais e intelectuais é algo compreensível à razão humana. Por isso, as virtudes teológicas são especificamente distintas das virtudes morais e intelectuais
 
— Suma Teológica, Tomás de Aquino67 .
Avançando o raciocínio, Tomás distingue quatro tipos de lei que governam os atos humanos: eterna, natural, humana edivina. "Lei eterna" é o decreto divino que governa toda criação, a "lei que é a Razão Suprema e não pode ser compreendida senão como algo imutável e eterno"68 . "Lei natural" é a "participação" humana na "lei eterna" descoberta pelarazão69 e baseada nos "princípios primeiros": "...este é o primeiro preceito da lei, que o bem deve ser feito e promovido e o mal, evitado. Todos os demais preceitos da lei natural se baseiam neste..."70 . Se a lei natural contém vários preceitos ou apenas este, o próprio Aquino esclarece: "todas as inclinações de quaisquer partes da natureza humana, como por exemplo as partes concupiscentes e irascíveis, na medida em que são governadas pela razão, pertencem à lei natural e se reduzem ao primeiro preceito, como afirmando acima: pois os preceitos da lei natural são muitos em si próprios, mas são todos baseados numa fundação comum"71 .
O desejo de viver e procriar são considerados por Tomás entre os valores básicos (naturais) do homem, sobre os quais todos os demais valores humanos estão baseados. De acordo com Tomás, todas as tendências humanas estão aparelhadas o "bem" real humano. E no caso destes dois desejos, a natureza humana em questão é o matrimônio, o presente completo de uma pessoa a outra que assegura uma família às crianças e um futuro à humanidade72 . Para os cristãos, Tomás definia que o amor era "desejar o 'bem' de outro"73 .
Sobre a "lei humana", Aquino conclui "...que, assim como no caso da razão especulativa, na qual tiramos conclusões em várias ciências a partir de princípios não demonstráveis e naturalmente conhecidos, conclusões estas não comunicadas a nós pela natureza, mas adquiridas pelos esforços da razão, é assim também com os preceitos da lei natural, pois a partir de princípios gerais e indemonstráveis, a razão humana precisa avançar para uma determinação mais precisa de certos assuntos. Estas determinações particulares, criadas pela razão humana, são chamadas de leis humanas desde que as outras condições essenciais da lei sejam observadas...", ou seja, a "lei humana" é a lei positiva, a lei natural aplicada pelos governos às sociedades74 .
Leis naturais e humanas não são adequadas sozinhas. A necessidade humana de que seu comportamento seja dirigido fez necessária a existência da "lei divina", que é a lei especificamente revelada nas Escrituras. Segundo Aquino, "O apóstolo diz:«Pois mudado que seja o sacerdócio, é necessário que se faça também mudança da Lei.» (Hebreus 7:12) Mas o sacerdócio tem duas facetas, como afirmado na própria passagem, viz., os sacerdócio levita e o sacerdócio de Cristo. Portanto, a lei divina tem também duas facetas, a Antiga Lei e a Nova Lei"75 .
Aquino se refere aos animais como estúpidos e que a ordem natural declarou que eles foram criados para uso humano. Ele negava que os homens tinham qualquer dever de caridade para com os animais por não serem eles "pessoas". Se não fosse assim, seria ilegal utilizá-los como fonte de alimento. Porém, este racional não dava aos homens permissão para serem cruéis com eles, pois "hábitos cruéis podem transbordar para o nosso tratamento dos seres humanos"76 77 .
Ainda tratando de ética e justiça, Aquino deu grandes contribuições para o pensamento econômico medieval. Ele tratou do conceito de preço justo, normalmente o preço de mercado ou o regulamentado e suficiente para cobrir o custo de produção do vendedor. Ele argumentava que era imoral para os vendedores aumentarem os preços simplesmente por que os compradores estavam em algum momento precisando demais do produto78 79 .

Teologia[editar | editar código-fonte]

Tomás via a teologia (a "doutrina sagrada") como uma ciência51 cuja matéria-prima eram as Escrituras e a tradição da Igreja Católica. Estas fontes, por sua vez, seriam, segundo ele, produtos da auto-revelação de Deus a indivíduos ou grupos de indivíduos através da história. Finalmente,  e razão, distintas e relacionadas, seriam as duas ferramentas primárias para processar os dados teológicos. Ele acreditava que ambas eram necessárias- ou, melhor, que a "confluência" de ambas era necessária - para obter-se o verdeiro conhecimento de Deus. Em suas obras, Aquino mesclou a filosofia grega com a doutrina cristã ao sugerir que o pensamento racional e o estudo da natureza, como a revelação, são meios válidos de entender as verdades pertinentes a Deus. Segundo Aquino, Deus se revela através da natureza e, portanto, estudá-la é estudar Deus. O objetivo final da teologia, para Tomás, era utilizar a razão para perceber a verdade sobre Deus e experimentar a salvação através desta verdade.

Revelação[editar | editar código-fonte]

Aquino acreditava que a verdade é conhecida pela razão ("revelação natural") e pela fé ("revelação sobrenatural"). Esta tem sua origem na inspiração pelo Espírito Santo e está disponível através do ensinamento dos profetas, reunidos nas Escrituras e transmitidos pelo magisterium, coletivamente chamado de "tradição". Já a revelação natural é a verdade disponível a todos através da natureza humana e dos poderes da razão, por exemplo aplicando métodos racionais para perceber a existência de Deus.
Assim, apesar de se poder deduzir a existência e os atributos de Deus através da razão, certas especificidades só podem ser conhecidas através da revelação especial de Deus em Jesus Cristo. Os principais componentes teológicos do cristianismo, como a Trindade e a Encarnação, são revelados nos ensinamentos da Igreja e nas Escrituras; não podem, portanto, ser deduzidos pela razão humana.

Criação[editar | editar código-fonte]

Como católico, Aquino acreditava que Deus é o "criador do céu e da terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis"; como Aristóteles, defendia que a vida poderia se formar a partir de matéria não viva ou de plantas, uma forma de abiogênese conhecida como "geração espontânea":
Como a geração de uma coisa é a corrupção de outra, não é incompatível com a primeira a formação de coisas; que, da corrupção do menos perfeito, o mais perfeito deva ser gerado. Assim, animais gerados da corrupção de coisas inanimadas ou de plantas possam então ser gerados.
 
— Suma Teológica, Tomás de Aquino80 .
Além disso, Tomás defendia - em seu comentário sobre a "Física", de Aristóteles - a teoria de Empédocles de que várias mutações das espécies emergiram ainda durante a Criação. Ele argumenta que estas espécies foram geradas através de mutações no esperma animal de forma não esperada pela natureza. Para estas espécies, simplesmente não havia intenção de que tivessem existência perpétua:
O mesmo vale para aquelas substâncias que Empédocles afirma terem sido produzidas no começo do mundo, como a "descendência do touro", ou seja, meio-homem e meio-touros. Pois se tais coisas não conseguiram encontrar algum objetivo e um estado natural final para que pudessem ter sua existência preservada, não foi por que a natureza assim não quis [um estado final], mas por que eles não conseguiram ser preservados. Pois não foram gerados de acordo com a natureza, mas pela corrupção de algum princípio natural, como ainda hoje ocorre quando filhos monstruosos são gerados pela corrupção da semente
 
— Comentário sobre a Física, Tomás de Aquino81 .

Guerra justa[editar | editar código-fonte]

Santo Agostinho concordava fortemente com o senso comum de sua época, de que os cristãos deveriam ser pacifistas filosoficamente, mas que deviam utilizar a força como meio de preservar a paz no longo prazo. Ele argumentou muitas vezes que o pacifismo não era contrário à defesa dos inocentes ou à auto-defesa, por exemplo. Resumidamente, Agostinho acreditava que, para a preservação da paz no longo prazo, o uso justificado da força poderia ser necessário82 , mas estabelecia limites para isso, exigindo, por exemplo, que as guerras com esta finalidade deveriam ser defensivas e ter a restauração da paz (e não a conquista de vantagens) como objetivo83 .
Aquino, séculos depois, aproveitou-se da autoridade dos argumentos de Agostinho quando tentou definir as condições para que uma guerra fosse considerada justa84 , resumidos na "Suma":
  • Primeiro, a guerra deve ocorrer por uma causa boa e justa e nunca pela busca de riqueza ou poder.
  • Segundo, a guerra justa deve ser declarada por uma autoridade legalmente instituída, como um estado.
  • Terceiro, a paz deve ser a motivação central em meio à violência decorrente85 .

Natureza de Deus[editar | editar código-fonte]

Aquino acreditava que a existência de Deus era auto-evidente, mas não era evidente para os homens. "Portanto, digo que esta proposição, 'Deus existe', em si mesma, é auto-evidente, pois o predicado é o mesmo que o sujeito... Agora, como não conhecemos a essência de Deus, a proposição não é auto-evidente para nós e precisa ser demonstrada por coisas que são-nos mais conhecidas, apesar de menos conhecidas em sua própria natureza - nomeadamente, pelos efeitos"86 .
Ele acreditava também que se poderia demonstrar a existência de Deus. De forma breve na "Suma Teológica" e mais extensivamente na "Suma contra os Gentios", Aquino considera em detalhes seus cinco argumentos para a existência de Deus, amplamente conhecidos como"quinque viae" ("cinco vias"):
  • Movimento: algumas coisas indubitavelmente mudam sem sere capazes de provocar seu próprio movimento. Como, segundo o racional de Tomás, não pode haver uma cadeia infinita de causas para um movimento, decorre que deve existir um "Primeiro Movimentador", não movido por nada anterior e este seria o que todos entendem como sendo "Deus".
  • Causa: como no caso do movimento, nada é causa de si próprio e uma cadeia causal infinita seria impossível, deve haver uma "Primeira Causa", conhecida por "Deus". Aquino neste caso baseia-se nas assertivas de Aristóteles sobre os princípios do ser. O conceito de Deus como prima causa ("causa primeira") deriva do conceito aristotélico do "movedor imovível"87 .
  • Existência do necessário e do desnecessário: nossa experiência inclui coisas que certamente existem, mas que são, aparentemente, desnecessárias. Porém, não é possível que tudo seja desnecessário, pois então, quando nada houver [que seja necessário], nada existiria. Portanto, somos compelidos a supor que existe algo que existe "necessariamente", cuja necessidade deriva de si próprio; na realidade, ele próprio seria a necessidade para que tudo o mais existisse. Este seria Deus.
  • Gradação: se podemos perceber uma gradação nas coisas no sentido de que algumas são mais quentes, boas etc., deve haver um superlativo que é a coisa mais verdadeira e nobre e, portanto, a que "existe mais completamente". Esta, então, seria Deus.
  • Tendências ordenadas da natureza: uma direção para as ações em direção a uma finalidade se percebe em todos os corpos governados pela lei natural. As coisas sem consciência tendem a ser guiadas pelos que a tem. A isto chamamos "Deus"88 .
Sobre a natureza de Deus, Aquino acreditava que a melhor abordagem, geralmente chamada de via negativa em latim, é considerar o que Deus "não é". Seguindo assim, ele propôs cinco expressões sobre as qualidades divinas:
  • Deus é simples, sem composição de partes - como "corpo" e "alma" ou "matéria" e "forma"89 .
  • Deus é perfeito, nada Lhe-falta. Ou seja, Deus é diferente dos demais seres por Sua completa realização90 . Tomás definiu Deus como "Ipse Actus Essendi subsistens"("subsistente ato de ser")91 .
  • Deus é infinito. Ou seja, Deus não finito no sentido que os seres criados são física, intelectual e emocionalmente limitados. Esta infinidade deve ser diferenciada da simples infinidade de tamanho ou número92 .
  • Deus é imutável, não passível de mudanças de caráter ou essência93 .
  • Deus é uno, sem diversificação em si próprio. A unidade de Deus é tal que Sua essência é idêntica à Sua existência. Nas palavras de Tomás, "em si mesma, a proposição 'Deus existe' é necessariamente verdadeira, pois, nela, sujeito e predicado são o mesmo"94 .

Natureza de Jesus[editar | editar código-fonte]

Universidade de São Tomás de Aquino(Angelicum), uma das mais prestigiosas universidades em Roma.
Na "Suma Teológica", Tomás começa sua discussão sobre Jesus Cristo relembrado a histórica bíblica de Adão e Eva e descrevendo os efeitos negativos do pecado original. A partir daí, ele desenvolve seu argumento de que o objetivo daEncarnação era restaurar a natureza humana, removendo a "contaminação pelo pecado", algo que os humanos são incapazes de realizar por si mesmos. "A Sabedoria Divina julgou apropriado que Deus tornar-se-ia humano para que, assim, Este pudesse restaurar o homem e dar uma satisfação"95 . Tomás argumentou a favor da visão da satisfação da expiação, ou seja, que Jesus morreu "para dar satisfação por toda a raça humana, que foi sentenciada a morrer por causa do pecado"96 .
Aquino argumentou contra diversos teólogos que defendiam pontos de vista diferentes sobre Jesus. Em resposta a Plotino, afirmou que Jesus era verdadeiramente divino e não um simples ser humano. Contra Nestório, que sugeriu que o Filho de Deus estaria meramente conjuminado com o Cristo homem, defendeu que a completude de Deus era parte integral da existência de Cristo. Contra-atacou as visões de Apolinário defendendo que Cristo tinha uma alma verdadeiramente humana (racional, portanto) e a dualidade de naturezas de Cristo (a humana e a divina). Contra Eutiques, afirmou que esta dualidade permaneceu mesmo depois da Encarnação e, contra os ensinamentos de Maniqueu e Valentim, que as duas naturezas existiam simultaneamente e separadamente num único corpo humano real97 .
Resumindo, "Cristo tinha um 'corpo real' da mesma natureza que o nosso, uma 'verdadeira alma racional' e, além disso, a 'divindade perfeita'"98 :
Respondo que, a pessoa ou hipóstase de Cristo pode ser vista de duas formas. Primeiro como ela por si mesma e, assim, de todo simples, mesmo como a natureza do Verbo. Segundo, no aspeto da pessoa ou hipóstase a quem ela subsiste através de uma natureza; e, assim, a Pessoa de Cristo subsiste em duas naturezas. Assim, embora haja um ser subsistindo N'ele, há diferentes aspectos de subsistência presentes, motivo pelo qual diz que ele é uma pessoa composta, um ser subsistindo em dois99
Ecoando Atanásio de Alexandria, Aquino afirmou que "O Unigênito Filho de Deus...assumiu nossa natureza para que, feito homem, pudesse fazer dos homens deuses"100 .

Objetivo da vida humana[editar | editar código-fonte]

Aquino identificou que a razão da existência humana seria a união e amizade eterna com Deus, um objetivo alcançado através da visão beatífica, na qual uma pessoa experimenta a felicidade perfeita e sem fim ao presenciar a essência de Deus. Ela ocorre depois da morte como presente de Deus aos que na vida experimentaram a salvaçãoe a redenção através de Cristo101 .
O objetivo da união com Deus tem implicações para a vida das pessoas na terra. Segundo Tomás, a vontade dos indivíduos deve ser dirigida às coisas corretas, como caridade, paz e santidade. Ele via nesta orientação como um caminho para a felicidade e estruturou suas ideias sobre a vida moral à volta desta crença. A relação entre a vontade e o objetivo da vida é antecedente na natureza "por que a retidão da vontade consiste em ser obedientemente dirigida ao objetivo final [a visão beatífica]". Os que buscam verdadeiramente entender e ver Deus irão necessariamente amar o que Ele ama, um amor que requer moralidade e aparece nas escolhas cotidianas dos homens102 .

Tratamento dispensado aos heréticos[editar | editar código-fonte]

Aquino era um dominicano, ou seja, um membro da Ordem dos Pregadores (Ordo Praedicatorum) cujo objetivo inicial era a conversão dos albigenses e de outras facções heterodoxas de forma pacífica num primeiro momento, mas que logo degeneraria na violenta Cruzada Albigense. Na "Suma Teológica", escreveu:
Sobre os heréticos, dois pontos precisam ser observados: um do lado deles e outro, no da Igreja. Do lado deles há o pecado, pelo qual eles merecem não apenas serem separados da Igreja pela excomunhão, mas também separados do mundo pela morte. Pois é um problema muito mais grave corromper a fé que alimenta a alma do que forjar dinheiro, que sustenta a vida temporal. De onde se conclui que se os falsificadores de dinheiro e outros malfeitores são condenados à morte por isso pelas autoridades seculares, há muito mais motivos para os heréticos, tão logo sejam condenados por heresia, sejam não apenas excomungados, mas executados.
Da parte da Igreja, porém, há misericórdia, que procura a conversão dos desgarrados, e por isso ela não condena imediatamente, mas "depois da primeira e segunda admoestação", como ensinou o Apóstolo: depois disso, se persistir na teimosia, a Igreja, sem esperança de conversão, procura pela salvação dos demais excomungando-o e separando-o da Igreja; além disso, entrega-o ao tribunal secular para ser exterminado assim deste mundo pela morte.
 
— Suma Teológica, Tomás de Aquino103 .
Roubo simples, falsificação, fraude e outros crimes similares eram também ofensas passíveis de morte na época; o ponto de Aquino é que a gravidade da heresia, que trata não apenas de bens materiais, mas também dos espirituais de outros, é pelo menos tão grave quanto falsificação. A sugestão dele exige, porém, que os heréticos sejam entregues a um "tribunal secular" ao invés da autoridade magisterial. Além disso, a ideia de que os heréticos merecem a morte está relacionada à teologia de Aquino, segundo a qual os pecadores não tem um direito intrínseco à vida, "pois o pagamento do pecado é a morte; mas o presente grátis de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor"104 ). Seja como for, seu ponto é claro: heréticos devem ser executados pelo estado. Ele elabora ainda mais o tema no artigo seguinte quando diz:
No tribunal de Deus, aqueles que retornam são sempre recebidos, pois Deus é um examinador de corações e conhece os que retornam com sinceridade. Mas a Igreja não pode imitar Deus nisso, pois ela presume que os que recaem depois depois de terem sido recebidos uma vez não são sinceros em seu retorno; daí ela não pode excluí-los do cominho da salvação, mas não pode também protegê-los da sentença de morte.
 
— Suma Teológica, Tomás de Aquino105 .

Vida depois da morte e ressurreição[editar | editar código-fonte]

Alguma compreensão sobre o estado psicológico de Tomás de Aquino é fundamental para compreender suas crenças sobre a vida após a morte e a ressurreição. Seguindo a doutrina da Igreja, ele aceita que a alma continue existindo depois da morte do corpo. Como ele aceita também que ela é a forma do corpo, Aquino defende que o ser humano, assim como todas as coisas materiais, é um composto de "forma" e "matéria", uma versão do hilemorfismo aristotélico. A forma substancial (a alma humana) configura (define) a matéria-prima (o corpo) e é assim que um composto material se enquadra numa determinada espécie; no caso dos homens, a do "animal racional"106 . Portanto, o ser humano seria um composto de forma-matéria organizado para ser um animal racional. A matéria não pode existir sem ser configurado por uma forma, mas esta pode existir sem a matéria, o que abre espaço para a crença da separação da alma do corpo. Aquino afirma que a alma coexiste nos mundos material e espiritual e, portanto, tem algumas caraterísticas materiais e outras imateriais (como o acesso aos universais).
Finalmente, Aquino rejeitava a ideia de que a ressurreição necessite de alguma forma de dualismo (entre corpo e alma como distintos), defendendo que alma (parte do composto forma-matéria) persistia depois da morte e à corrupção do corpo, sendo capaz de existência autônoma no período entre a morte e a ressurreição. Ele sabe que os seres humanos são essencialmente físicos, mas que esta "fisicalidade" tem um espírito capaz de retornar a Deus depois da vida107 . Para ele, as recompensas e punições da vida depois da morte não são "apenas" espirituais. Por isso, a ressurreição é uma parte importante de sua filosofia sobre a alma. O homem é realizado e completo no corpo físico e, portanto, a vida eterna deve contar com almas materializadas em corpos ressuscitados. Além da recompensa espiritual, os homens podem então esperar o gozo de bençãos materiais e físicas107 .
Aquino afirma claramente sua posição sobre a ressurreição e a utiliza para defender sua filosofia da justiça: a promessa da ressurreição compensa os cristãos que sofreram neste mundo através de uma união celeste com o divino. Em suas palavras, "se não há ressurreição dos mortos, segue que não há nada de bom para os seres humanos fora desta vida"108 . Assim, a esperança da ressurreição seria responsável pelo ímpeto para as pessoas na terra abrirem mão de prazeres nesta vida; aqueles que se prepararam para a vida depois da morte, moral e intelectualmente, receberão recompensas ainda maiores pela graça divina. Aquino insiste que a beatitude será conferida por mérito e irá tornar as pessoas mais capazes de conceber o divino. Na mesma linha, a punição também está diretamente relacionada com esta preparação e as ações na terra108 .

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