ESPECIAL SOBRE O SÍNODO
"Os desafios pastorais da família no contexto da evangelização"

O Sínodo dos Bispos sobre os desafios pastorais da família teve início na manhã de domingo, dia 5 de Outubro com a Eucaristia presidida pelo Papa Francisco na Basílica Vaticana as 10 horas de Roma. Mas já no sábado no final da tarde,às 18 horas na Praça de S. Pedro aconteceu uma Vigília de Oração e Reflexão que abriu caminho a este percurso sinodal. Uma iniciativa da Conferência Episcopal Italiana na qual participarão os Padres Sinodais.
Abaixo algumas informações esclarecedoras sobre o desenvolvimento dos trabalhos sinodais, oferecidas durante um briefing na Sala de Imprensa da Santa Sé, realizado na última sexta feira, dia 3 de Outubro. Liberdade de expressão e respeito por cada posição deverão caracterizar os trabalhos do Sínodo dos Bispos – esta a principal afirmação do Cardeal Lorenzo Baldisseri, Secretário Geral do Sínodo que liderou os esclarecimentos aos jornalistas.
Uma novidade deve ser destacada: na abertura dos trabalhos em cada dia haverá o testemunho de um casal. Este testemunho terá a duração de cerca 4 minutos. Entre eles, também a experiência de um matrimónio misto entre um muçulmano e uma católica. Na primeira semana, o debate na Sala seguirá a ordem temática do “Documento de trabalho” preparatório. Por exemplo, a 8 e a 9 de outubro, o debate vai concentrar-se nas situações pastorais difíceis e nos desafios que dizem respeito à abertura das famílias à vida.
Uma grande celebração final e particularmente significativa será a missa conclusiva, no domingo, 19 de outubro, às 9h30min, na Praça S. Pedro, que coincidirá com a beatificação de Paulo VI, o Pontífice que em 1965 instituiu a Assembleia Sinodal. O Papa Francisco proporá em cada dia a oração inicial, com outras intervençoes no início e no final dos trabalhos.
Nova também a “máquina de informação” deste Sínodo, que terá um briefing diário sobre o andamento dos trabalhos, na Sala de Imprensa da Santa Sé, em diversas línguas, com a publicação da lista dos Padres Sinodais que se pronunciaram em cada dia e o início de um serviço Twitter com a hashtag#Synod14. Será também publicado um boletim diário com a síntese das comunicações na Sala do Sínodo.
Dois documentos, em particular, são aguardados com expectativa: a publicação da mensagem conclusiva, no sábado 18 de outubro, e o novo “Relatório do Sínodo” que substitui as clássicas “Proposições finais”. Este relatório será apresentado diretamente ao Papa e será tornado público posteriormente. É a primeira vez que um Sínodo se realiza em duas etapas. De facto, em 2014, será realizada somente a primeira parte de um percurso que se concluirá em 2015, com um Sínodo Geral. (JE/RS)
OS PRONUNCIAMENTOS DO PAPA
VIGÍLIA DE ORAÇÃO PREPARATÓRIA PARA
O SÍNODO SOBRE A FAMÍLIA
O SÍNODO SOBRE A FAMÍLIA
DISCURSO DO PAPA FRANCISCO
Praça de São Pedro
Sábado, 4 de Outubro de 2014
Sábado, 4 de Outubro de 2014
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Queridas famílias, boa noite!
Desce já a noite sobre a nossa assembleia. É a hora em que de bom grado se regressa a casa para se reunir à mesma mesa na consistência dos afectos, do bem feito e recebido, dos encontros que abrasam o coração e o fazem crescer, vinho bom que antecipa, nos dias do homem, a festa sem ocaso.
Mas é também a hora mais pesada para quem se vê cara a cara com a própria solidão, no crepúsculo amargo de sonhos e projectos desfeitos. Quantas pessoas arrastam os seus dias no beco sem saída da resignação, do abandono, se não mesmo do rancor! Em quantas casas falta o vinho da alegria e, consequentemente, o sabor — a própria sabedoria — da vida! Nesta noite, com a nossa oração, fazemo-nos voz de uns e de outros: uma oração por todos.
É significativo como permanece viva, em cada nascido de mulher — mesmo na cultura individualista que perverte e torna efémeros os laços — uma exigência essencial de estabilidade, duma porta aberta, de alguém com quem tecer e partilhar a narração da vida, duma história a que se pertença. A comunhão de vida assumida pelos esposos, a sua abertura ao dom da vida, a defesa recíproca, o encontro e a memória das gerações, o acompanhamento educativo, a transmissão da fé cristã aos filhos... Com tudo isto, a família continua a ser escola incomparável de humanidade, contribuição indispensável para uma sociedade justa e solidária (cf. Exort. ap. Evangelii gaudium , 66-68). E quanto mais profundas são as suas raízes, tanto mais é possível singrar e chegar longe na vida, sem se extraviar nem se sentir estrangeiro em terra alguma. Este horizonte ajuda-nos a perceber a importância da assembleia sinodal que tem início amanhã.
O próprio convenire in unum à volta do Bispo de Roma já é evento de graça, no qual a colegialidade episcopal se manifesta num caminho de discernimento espiritual e pastoral. Para individuar aquilo que o Senhor pede hoje à sua Igreja, devemos prestar ouvidos às pulsações deste tempo e sentir o «odor» dos homens de hoje, até ficar impregnadosb das suas alegrias e esperanças, das suas tristezas e angústias (cf. Gaudium et spes , 1). Então saberemos propor, com credibilidade, o evangelho, a boa nova sobre a família.
Conhecemos realmente como há, no Evangelho, uma força e uma ternura capazes de vencer aquilo que cria infelicidade e violência. Sim, no Evangelho, há a salvação que cumula as necessidades mais profundas do homem! Desta salvação — obra da misericórdia de Deus e sua graça — somos, como Igreja, sinal e instrumento, sacramento vivo e eficaz (cf. Exort. ap.Evangelii gaudium , 112). Se assim não fosse, o nosso edifício não passaria de um castelo de cartas, e os pastores reduzir-se-iam a clérigos de estado, em cujos lábios o povo procuraria em vão o frescor e o «perfume do Evangelho» ( Ibid ., 39).
Vemos surgir, neste quadro, os conteúdos da nossa oração. Para os padres sinodais, pedimos antes de mais nada, do Espírito Santo, o dom da escuta: escuta de Deus, até ouvir com Ele o grito do povo; escuta do povo, até respirar nele a vontade a que Deus nos chama. A par da escuta, suplicamos a disponibilidade para um confronto sincero, aberto e fraterno, que nos leve a ocupar-nos, com responsabilidade pastoral, das interrogações que esta mudança epocal traz consigo. Deixemos que inundem o nosso coração, sem nunca perdermos a paz, mas com a serena confiança de que o Senhor não deixará, a seu tempo, de reconduzir à unidade. Porventura não nos fala a história da Igreja — como sabemos — de tantas situações análogas que os nossos pais souberam superar com obstinada paciência e criatividade?
O segredo está num olhar — e é o terceiro dom que imploramos com a nossa oração. É que, se verdadeiramente pretendemos verificar o nosso passo no terreno dos desafios contemporâneos, a condição decisiva é manter o olhar fixo em Jesus Cristo, deter-se na contemplação e adoração do seu rosto. Se assumirmos o seu modo de pensar, viver e relacionar-se, não teremos dificuldade em traduzir o trabalho sinodal em indicações e percursos para a pastoral da pessoa e da família. Na verdade, todas as vezes que voltamos à fonte da experiência cristã, abrem-se estradas novas e possibilidades inimagináveis. Assim no-lo deixa intuir a indicação evangélica: «Fazei o que Ele vos disser» (Jo 2, 5). São palavras que contêm o testamento espiritual de Maria, «amiga sempre solícita para que não falte o vinho na nossa vida» (Exort. ap.Evangelii gaudium , 286). Façamo-las nossas!
Então as três coisas — a nossa escuta e o nosso confronto sobre a família, amada com o olhar de Cristo — tornar-se-ão uma ocasião providencial para renovar — a exemplo de São Francisco — a Igreja e a sociedade. Com a alegria do Evangelho, reencontraremos o passo duma Igreja reconciliada e misericordiosa, pobre e amiga dos pobres; uma Igreja capaz de «vencer, pela paciência e pela caridade, as suas aflições e dificuldades tanto internas como externas» (Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. sobre a Igreja Lumen gentium , 8).
Que o Vento do Pentecostes sopre sobre os trabalhos sinodais, sobre a Igreja, sobre a humanidade inteira; desate os nós que impedem as pessoas de se encontrarem, sare as feridas que sangram tanto, reacenda a esperança; há tanta gente sem esperança! Conceda-nos aquela caridade criativa que consinta amar como Jesus amou. E o nosso anúncio reencontrará a vitalidade e o dinamismo dos primeiros missionários do Evangelho.
SANTA MISSA NA ABERTURA
DO SÍNODO EXTRAORDINÁRIO SOBRE A FAMÍLIA
DO SÍNODO EXTRAORDINÁRIO SOBRE A FAMÍLIA
HOMILIA DO PAPA FRANCISCO
Basílica Vaticana
Domingo, 5 de Outubro de 2014
Domingo, 5 de Outubro de 2014
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Nas leituras de hoje, é usada a imagem da vinha do Senhor tanto pelo profeta Isaías como pelo Evangelho. A vinha do Senhor é o seu «sonho», o projecto que Ele cultiva com todo o seu amor, como um agricultor cuida do seu vinhedo. A videira é uma planta que requer muitos cuidados!
O «sonho» de Deus é o seu povo: Ele plantou-o e cultiva-o, com amor paciente e fiel, para se tornar um povo santo, um povo que produza muitos e bons frutos de justiça.
Mas, tanto na antiga profecia como na parábola de Jesus, o sonho de Deus fica frustrado. Isaías diz que a vinha, tão amada e cuidada, «produziu agraços» (5, 2.4), enquanto Deus «esperava a justiça, e eis que só há injustiça; esperava a rectidão, e eis que só há lamentações» (5, 7). Por sua vez, no Evangelho, são os agricultores que arruínam o projecto do Senhor: não trabalham para o Senhor, mas só pensam nos seus interesses.
Através da sua parábola, Jesus dirige-se aos sumos sacerdotes e aos anciãos do povo, isto é, aos «sábios», à classe dirigente. Foi a eles, de modo particular, que Deus confiou o seu «sonho», isto é, o seu povo, para que o cultivem, cuidem dele e o guardem dos animais selvagens. Esta é a tarefa dos líderes do povo: cultivar a vinha com liberdade, criatividade e diligência.
Mas Jesus diz que aqueles agricultores se apoderaram da vinha; pela sua ganância e soberba, querem fazer dela aquilo que lhes apetece e, assim, tiram a Deus a possibilidade de realizar o seu sonho a respeito do povo que Ele escolheu.
A tentação da ganância está sempre presente. Encontramo-la também na grande profecia de Ezequiel sobre os pastores (cf. cap. 34), comentada por Santo Agostinho num famoso Discurso que lemos, ainda nestes dias, na Liturgia das Horas. Ganância de dinheiro e de poder. E, para saciar esta ganância, os maus pastores carregam sobre os ombros do povo pesos insuportáveis, que eles próprios não põem nem um dedo para os deslocar (cf. Mt 23, 4).
Também nós somos chamados a trabalhar para a vinha do Senhor, no Sínodo dos Bispos. As assembleias sinodais não servem para discutir ideias bonitas e originais, nem para ver quem é mais inteligente… Servem para cultivar e guardar melhor a vinha do Senhor, para cooperar no seu sonho, no seu projecto de amor a respeito do seu povo. Neste caso, o Senhor pede-nos para cuidarmos da família, que, desde os primórdios, é parte integrante do desígnio de amor que ele tem para a humanidade.
Nós somos todos pecadores e também nos pode vir a tentação de «nos apoderarmos» da vinha, por causa da ganância que nunca falta em nós, seres humanos. O sonho de Deus sempre se embate com a hipocrisia de alguns dos seus servidores. Podemos «frustrar» o sonho de Deus, se não nos deixarmos guiar pelo Espírito Santo. O Espírito dá-nos a sabedoria, que supera a ciência, para trabalharmos generosamente com verdadeira liberdade e humilde criatividade.
Irmãos sinodais, para cultivar e guardar bem a vinha, é preciso que os nossos corações e as nossas mentes sejam guardados em Cristo Jesus pela «paz de Deus que ultrapassa toda a inteligência» (Flp 4, 7). Assim, os nossos pensamentos e os nossos projectos estarão de acordo com o sonho de Deus: formar para Si um povo santo que Lhe pertença e produza os frutos do Reino de Deus (cf. Mt 21, 43).
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